O julgamento da ação coletiva contra a BHP será retomado na Inglaterra na segunda-feira. A medida representa 620 mil vítimas da tragédia de Mariana, além de municípios e empresas. O gabinete de Pogost Goodhead, que cuida do caso, pede uma indemnização à mineradora, acionista da Samarco, responsável pela barragem que ruiu, matando 19 pessoas e poluindo o rio Duce em 2015.
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Na primeira semana, 13 e 21 de janeiro, as audiências terão como foco questões relacionadas ao direito ambiental, com prestação de depoimentos periciais. Nos próximos sete dias, os depoimentos serão de especialistas geotécnicos, aprofundando as questões técnicas relacionadas ao rompimento da barragem.
Em fevereiro, as partes envolvidas prepararão as suas alegações finais, que serão apresentadas entre 5 e 13 de março.
Mesmo com o novo acordo no Brasil, assinado no final de outubro, o julgamento continuou na Inglaterra. Em dezembro, o governo brasileiro, por meio do Ministério das Relações Exteriores, informou oficialmente à corte inglesa a aprovação do acordo. Todo o conteúdo, milhares de páginas, foi enviado à Justiça.
O novo acordo prevê que as empresas envolvidas no acidente – Vale, BHP e Samarco – destinarão R$ 100 bilhões ao governo federal, a Minas Gerais, ao Espírito Santo e aos municípios atingidos pelo acidente. Esse pagamento será administrado por meio do Fundo BNDES, Fundo Rio Doce. O primeiro pagamento de R$ 5 bilhões será feito 30 dias após a assinatura do acordo jurídico.
Outros R$ 32 bilhões serão destinados à indenização individual, com valor médio de R$ 35 mil por pessoa, além dos R$ 38 bilhões que as empresas afirmam já ter desembolsado, por meio da Fundação Renova, criada em 2016 para compensar danos causados por o desastre. incidente. O valor total do acordo chega a 170 bilhões de riais brasileiros, e o acordo deverá encerrar mais de 180 mil ações judiciais no Brasil.
Como o acordo poderia afetar a decisão da Inglaterra?
Com a renegociação, o principal argumento a favor das empresas é que uma vítima não pode ser indenizada duas vezes pelo mesmo dano – o que é chamado de duplicado no meio jurídico. Ou seja, como houve acordo para os pagamentos no Brasil, as mesmas empresas não poderão ser cobradas novamente no exterior.
A BHP é a única ré no processo inglês, mas a Vale pagará metade da indenização caso a mineradora anglo-australiana perca o caso, por acordo entre elas. Outro processo judicial sobre o incidente está em fase inicial na Holanda.
Advogados especializados em direito ambiental acreditam que é possível que o tribunal inglês decida a favor das empresas com base no acordo, mas o tribunal de Londres tem soberania para prosseguir com o julgamento. Eles acreditam que ganhou força o argumento de que uma vítima não pode ser indenizada duas vezes pelo mesmo dano, o que livraria as mineradoras de terem que devolver na Inglaterra as indenizações que já concordaram em pagar no Brasil.
Outra possibilidade que se aproxima é que a juíza Finola O’Farrell, responsável pelo caso, considere que a solução brasileira foi insuficiente e exija novas indenizações.
Alexander Levin, professor de direito ambiental da Escola Paulista de Direto, acredita que o processo de Londres não deveria existir, já que se discutem reparações no Brasil:
– Seria errado o tribunal inglês condenar novamente pelo mesmo incidente, se a indenização já foi determinada e paga no tribunal brasileiro.
No entanto, ele explica que é possível que a justiça inglesa decida a favor das vítimas porque acredita que a indenização brasileira foi insuficiente.
– O juiz inglês não é obrigado a desistir do caso. Pode-se entender que a vítima foi indenizada de forma insuficiente e que foi pressionada a aceitar um valor menor. Ou a compensação demorou muito para ser paga ou as vítimas não receberam compensação suficiente, diz Levin.
Consultor em direito ambiental, professor da Unirio e chefe da Comissão de Direito do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), Paulo Besa rejeita tese de valor insuficiente. Ele afirma que embora seja realizado na Inglaterra, o julgamento é baseado na legislação e nas normas brasileiras.
— A indenização está prevista no Código Civil Brasileiro, com normas nos tribunais. Pode-se dizer que os valores são baixos, mas não se pode fugir desse parâmetro – explica Besa, que, apesar de entender a necessidade de levar em conta a Convenção na decisão inglesa, critica a posição do tribunal e das autoridades brasileiras. O Brasil precisa ter uma estrutura mais adequada para lidar com esse tipo de vítima.
Bessa destacou as dificuldades em fornecer provas às 620 mil vítimas do processo que decorreu em Londres.
— Tudo foi mal administrado, mas não se pode dizer que o pagamento agora seja insignificante. Não é possível afirmar na Inglaterra que ninguém recebeu nada — diz Besa, que acrescenta que no Brasil se paga em média R$ 60 mil como indenização por danos morais em evento que resultou em morte.
O certo a fazer é que os tribunais ingleses considerem o acordo brasileiro, bem como as implicações que a nova compensação poderá ter para as empresas, afirma Larissa Coelho, advogada da área de ação coletiva e direito ambiental e grupo ESG do Nelson Willians Advogados. Mas ele admite que o cenário atual não tem precedentes
– Embora já tenhamos testemunhado ações coletivas além das fronteiras nacionais, esta é a maior. Ambos os tribunais (brasileiro e inglês) são soberanos e suas decisões terão implicações.
O escritório nega dupla compensação
O gabinete de Pogost Goodhead disse num memorando que o acordo brasileiro não entra em conflito com o julgamento de Londres.
“É importante ressaltar que não haverá duplicação de valores pagos na renegociação e na ação inglesa. Isso porque nossos clientes exigem indenização por uma série de danos morais e materiais que não estão cobertos pelo acordo no Brasil. Explicaram que a renegociação prevê a criação de novos programas de compensação e define critérios de elegibilidade que excluirão centenas de milhares de pessoas afetadas, que continuarão a tomar medidas inglesas como alternativa à procura de justiça.